A segunda visita não foi tão descontraída como a primeira. Não a apanhei ainda na marquesa, a acabar de fazer o tratamento da noite, disponível para ser abraçada e ficar encostada a mim recebendo o meu carinho. Estava no seu espaço próprio, com menos mobilidade, a fazer soro.
Deitava-se sobre a minha mão e pedia-me carinho, que recebeu durante o espaço de uma hora em que estive lá. Vim para casa, sabendo que estava nas mãos da melhor médica do mundo, e que já só faltava um dia.
Sábado à noite fui buscá-la. Sabia que ainda iam ter que dar-lhe mais medicação e afastá-la de mim um bocadinho, antes de poder finalmente levá-la.
Sentei-me ao lado dela, conversando com ela, e não mostrando uma proximidade tão grande que a levasse a pensar que iria sair dali logo nos minutos seguintes, ou que eu estaria a ir-me embora quando a deixasse aos cuidados da doutora para os últimos tratamentos.
Mas depois de uma pequena espera, pude, finalmente, fazer a viagem de 15 minutos com ela para casa. Quando chegou, saltou agilmente para cima da minha cama, mostrando que esta intervenção cirúrgica tinha sido muito mais simples do que a de há um ano e dois meses.
Decidi que neste primeiro dia iríamos passar a noite juntos e sozinhos. Tinha medo que o resto do pessoal cá de casa a incomodasse, depois do que pareceu uma longa ausência que quebrava e punha em causa todas as rotinas do dia-a-dia.
Mas também porque queria ficar essas horas encostado a ela, ouvindo a sua respiração gentil e reconfortando-a. No dia seguinte, de manhã, quando os outros ainda estavam meio adormecidos, resolvi promover logo a reaproximação.
O Chiquinho, que, em alturas normais, passa o tempo a persegui-la, cheirou a Matilde e deu-lhe as boas vindas. O Jeremias fez o mesmo. Só a Amélinha, a “Gáata!!”, é que demorou uns dias a aceitar de novo a sua companheira de brincadeiras e tardes passadas enroscadas uma na outra a aquecerem-se. Mas depois do receio e surpresa inicial, isso passou-lhe.
Houve mais alguns percalços. Após esta segunda operação, agora apenas para retirar um pequeno nódulo, a minha princesinha não queria tomar a medicação com a comida, a única forma que, ao longo dos anos, consegui desenvolver com sucesso para medicá-la.
Ao segundo dia, voltei a usar a técnica mais íntima e personalizada, a que recorro em casos de muita falta de vontade da parte dela, e que, no dia anterior, não resultara. Dar-lhe a comida com medicação à colherada. Nesta segunda tentativa correu bem, e nas seguintes também.
Andava, igualmente, com falta de apetite. A minha querida doutora deu-lhe um comprimido para isso; Abri um novo saco de comida – com o cheiro intenso da alimentação acabada de estrear – e tudo se encaminhou.
O fármaco que a doutora lhe prescreveu teve o efeito secundário de a tornar muito, muito mais faladora. Toda essa conversação aparentou, desde o início, ser uma forma de mostrar que precisava ainda mais de carinho do que o habitual.
Queria ser mimada… De minuto a minuto. Enquanto aquecia o almoço, sentei-me no chão. A minha Matildinha saltou para o meu colo, amassou-me e ficou a ronronar durante quinze minutos enquanto a acariciava.
O seu grande rival no meu coração, o Chiquinho, nem pestanejou. Ao longo da semana, sempre mostrou compreender perfeitamente aquilo que a sua amiga, com quem me disputa todos os dias, estava a passar.
Vai até perto dela, cheira-a, dá-lhe umas lambidelas e mostra-lhe a sua solidariedade, que ela, alguns momentos depois, percebe que é pacífica e bem intencionada.
Enquanto desejo intensamente que a minha top-model de fatinho cor-de-rosa se tenha visto livre para sempre da doença que a atacou, ela vai permanecendo longas temporadas nos lugares que associa ao conforto e à segurança.
A sua caminha… E os arranhadores que a sua mamã, a minha ex-mulher, lhe trouxe dedicada e carinhosamente de Inglaterra no Natal. E que têm sido um enorme sucesso cá em casa. Servem aos habitantes daqui de cadeira, ginásio, brinquedo e fonte inesgotável de bolas de cartão que lhes arrancam e com as quais depois jogam incessantemente, mordiscando-as e pontapeando-as no soalho de madeira.
Bem vinda, Matilde, a gatinha mais fofa, doce e querida que alguém poderia conhecer!