Que vale a pena nesta passagem?

Sentou-se na esplanada do Nepalês frequentado em busca de comida, conforto e boa disposição, pousou a carteira e o telemóvel e ali ficou algumas horas.

Éramos três. O meu querido amigo-herói especialista em tecnologia e em ajudar pessoas.

A minha amiga que sabe conversar e ouvir como ninguém, e em casa de quem me senti como na minha desde os primeiros minutos.

E eu.

À frente do maravilhoso Caril Vegano do Base Camp, o melhor restaurante de Cacilhas, tudo aconteceu.

Naquele pátio secreto reservado aos clientes especiais, falámos da vida dele, da existência dela e dos meus dias.

Dialogámos sobre o Trump, o Bolsonaro, o Costa, o Marcelo, a Temido, a Freitas, o Santos.

Debatemos sobre a ciência, os factos, o jornalismo, a política, a anti-política, o populismo.

Havia mais de quatro meses que não nos víamos.

Aquele encontro foi um bálsamo que sarou os ferimentos dos nossos espíritos vulneráveis.

Foi um pedacinho de desconfinamento em que lavámos as nossas almas ao expôr o nosso eu.

Desabafámos tudo, vingámos as pequenas e grandes mágoas.

Não se dormiu muito em tal noite, nem essa era a ideia.

Horas mais tarde, a alvorada trouxe-nos a um novo dia.

Curados e reforçados.

Prontos para nova jornada de combate confinado.

Só se vive uma vez.

Que seja com amor, amizade, boa comida, boa cerveja, boa conversa.

Que mais vale a pena nesta passagem?

Mistérios da natureza animal e humana

A nossa relação tem vindo a atingir a perfeição ao longo dos anos.

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“Gatinhaa!!” não é menos preciosa que o meu braço ou outra parte de mim. Jeremias, O Gato, aprofundou a conexão do seu cérebro com a minha mente durante esta década. E mais ainda em tempos pandémicos.

A verdade é que passamos 24 horas por dia juntos.

E se me preocupo com a frágil saúde da minha bonequinha cor de azeviche e de olhos cintilantes que me veneram, com este sólido tigre de 13 anos não é diferente.

Os seus apetites, as suas indisposições e a sua idade também me deixam em alerta permanente.

Idolatro a minha pequenina de sete anos e o meu pensamento está o tempo todo virado para o sénior lindo e carinhoso que segue cada um dos meus movimentos como uma sombra.

De modo que o lince listado cujo mundo gira à minha volta quase que sente os meus pensamentos e as minhas acções antes de acontecerem.

A minha mãe explicou-me que isto é natural com pessoas e animais que passam a vida juntos durante muito tempo.

Quando estou a planear levantar-me para ir almoçar, parece que antes de ter essa decisão totalmente formulada pelas minhas sinapses neuronais já ele está a levantar-se de cima do sofá junto à luminosa janela que prefere, a miar e a dizer-me: “Vá, humano, vai lá e eu faço-te companhia”.

Começo a pensar: “Jeremias, estás aí parado há tanto tempo, está tudo bem?”. Levanta-se, mia e vai comer uns grãos de ração.

Digo para mim que já estou sentado há muito e quero ir esticar as pernas. Desenrola-se e aparece junto a mim como que por milagre, olhando-me, conversando comigo e dizendo: “Bora. Vamos mexer-nos um bocado!”.

São assim os mistérios da natureza animal e humana.