A amiga secreta do Jeremias e da Amélinha

O meu ronronante tigrinho Jeremias andava com um apetite voraz.

Devo ter exagerado um pouco na quantidade de ração.

O pedaço que sobrou era visível, não seria coisa que se deitasse fora, mas também não ia ficar no prato até de manhã, já que perderia o interesse para ele.

Eram duas da manhã, fim de turno.

O destino era óbvio.

Ao descer as escadas, o silêncio era total.

À porta do prédio, a princesinha, gatinha já familiar e amiga há um ano e meio.

Se lhe ia pôr a comida no abrigo, os amiguitos, muitos mais afoitos e expeditos, passar-lhe-iam à frente.

Sossego, ninguém à volta.

Rasgo e abro o envelope de papel com a ração, coloco no chão como uma pequena folha aberta.

Mesmo a um metro de mim, atira-se à pequena refeição.

O vento revira a folha, recua, assusta-se, endireito o papel. Duas ou três vezes.

Perco a paciência, ponho as chaves de casa em cima do envelope, recuo dois passos.

A fofinha come tudo rapidamente, apanha todos os grãos à frente, atrás, por cima, por baixo, dos lados.

Aguardo um bocadinho.

Apanho as chaves, recolho a folha, deito no lixo.

Esta noite a minha amiga teve menos fome.

Um felino fenomenal

Era apenas um visitante da casa.

Quando chegava, acolhia-me com o traço central da sua personalidade.

O entusiasmo, a boa disposição, a vontade de dar e receber carinho.

As deslocações a tal domicílio tornaram-se mais frequentes e prolongadas.

O Jeremias mal sabia que, muitos anos depois, o amigo-visitante-residente havia de vir a tornar-se o seu humano número 1, embora a sua mamã o visite ávida e apaixonadamente sempre que se desloca a Portugal, e se adorem um ao outro como no primeiro dia.

A vida de todas as jornadas, noites, horas e minutos, o magnífico tigre que mia passou a partilhá-la comigo e com a sua discípula, a “Gááta!!”.

E, por uns anos, com dois anjos que agora já voltaram ao céu, o Meu Chiquinho e a doce Matildinha.

Jeremias é um gato enérgico e automático.

99,9% das vezes que me desloco da cadeira, da secretária de trabalho, do sofá, da cama, e, em especial, para a casa de banho, tenho instantaneamente o meu felino ao meu lado, a espalhar-se pelo tapete, a ronronar e a pedir atenção. Teleporta-se.

Estando sentado ou deitado no sofá ou na cama, este irresistível “fora-da-lei” estará sempre aconchegado sobre mim, a aquecer-me e mimar-me.

O meu belo lincezinho, além de ser o mais companheiro dos animais de companhia, tem um papel único na minha vida.

Foi o primeiro patudo que conheci de perto, e que, junto com a sua irmã Matilde, me recebeu como se fizesse parte da existência dele desde todo o sempre.

Escreveu empenhadamente a primeira página da minha história de amor com ele, Jeremias, com a meiga Matildinha, com o profundamente amado Chiquinho e com a “Gááta!!”, esse pedacinho (o melhor bocado) de mim.

E desde que nasceu, em Outubro de 2006, já passaram 14 anos.

Jeremias, meu amor, mais uma volta ao Sol! Obrigado, lindo.