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O Ritual

Imersos na escuridão profunda, espessa e impenetrável, os três vultos avançavam nas trevas.

As enxurradas tinham povoado o caminho de pernadas, paus, pedras e lama.

Charcos dificultavam a progressão.

Os três contornavam, abriam caminho, pontapeavam os obstáculos com persistência.

Conversavam com animação, mas em surdina, respeitando a hora e sem pensar que naquele lugar remoto e sombrio ninguém iria escutá-los.

Ouviam-se os corvos e os mochos ao longe, a canção do rio, o borbulhar das fontes.

A peregrinação nocturna prosseguia, rumo a um monumento milenar oculto entre a vegetação, em paragens onde pessoa alguma se dirigiria.

Chegadas ao seu destino, as três figuras descobriram-se parcialmente.

Do interior dos casacos compridos e escuros saíram três facas longas, três malaguetas de três centímetros, três cabeças de alho redondas e grandes e três páginas de um livro misterioso, cheias de pó e humidade.

As três vozes começaram a soar no silêncio, ainda que não chegassem a ouvidos nenhuns.

— Grande mestre e dirigente de todas as coisas do universo, atendei-nos.

— Aqui te ofertamos três gotas de fogo, três fragrâncias antigas, três páginas do grande livro.

— Nós te pedimos Paz, Harmonia, Futuro.

As três frases foram repetidas três vezes, cada vez mais alto, mas nunca vieram a ser escutadas por humanos.

As três figuras voltaram-se e desvaneceram-se na noite.

Uma nuvem carregada ocultou tudo o que pudesse ser observado na clareira.

Uma estrela brilhou com uma luz fraca ofuscada pela dúvida.

A manhã chegou, três horas depois.

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