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A conversa que não aconteceu

A menina, em idade de saber ler, contar e reflectir, entra no estabelecimento.

Tem cabelos escuros e uns olhos pretos, brilhantes, em constante movimento. Não sabe onde há-de sentar-se.

Depois de andar para a direita e para a esquerda acaba por decidir-se pela mesa em frente. Fica ali algum tempo sozinha.

O simpático idoso que anda a recolher uma ou outra peça de louça para devolver ao balcão chega ao pé dela e pergunta-lhe como está, se está tudo bem.

A garota responde que sim e o ancião sorri para ela, carinhoso. Vai ele próprio instalar-se na esplanada e beber o seu café.

Passado um bocado, chega o pai da pequena. Não um, mas dois pares de fones pendurados nos ouvidos.

Um telefone inteligente e um computador tablet para ele, e outro tablet para a filha.

Cada um agarra-se ao seu dispositivo (dois, no caso dele).

O homem de 40 anos vai de vez em quando à rua com o i-phone e um dos pares de auscultadores, fazer uma chamada. Depois volta, e continuam os dois a interagir com os seus écrãs, não um com o outro.

Cerca de uma hora depois, trocam-se as primeiras palavras: “Vamos embora, filha?”. “Sim.”.

O homem de 70 anos que andava a levar os pires para o balcão, e que nunca tinha visto a miúda, dialogou mais com ela do que o pai.

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