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O guarda-chuva

Olá. Foi o senhor que pediu três guarda-chuvas, mesmo três? Aqui estão.

Sim, fui eu. Eu uso o pano dos guarda-chuvas para fazer babetes impermeáveis, que vendo a lares da terceira idade.

Tenho um atelier, onde faço esse tipo de trabalhos e arranjos de costura. Vivo aqui na rua porque o dinheiro não dá para tudo.

Já tive 22 funcionárias a trabalhar para mim, mas agora sou só eu. Estou aqui, mas como pode ver estou limpo e não cheiro mal.

Quando vou falar com alguém para vender os meus produtos, vou sempre bem vestido e arranjado. Muitas pessoas que vivem na rua deixam-se desleixar, e eu digo-lhes que aquilo é mau para eles, para a saúde deles.

Deixam-se ficar assim, acomodam-se, desleixam-se. Eu não faço isso. Trabalho e quero melhorar a minha situação. É claro que não vou ganhar grandes fortunas… Não posso aceitar encomendas muito grandes, porque não tenho capacidade de resposta. Mas quero melhorar a minha vida.

Não me vou acomodar. As pessoas não se podem acomodar, têm que trabalhar e fazer alguma coisa por elas.

Agradece e coloca os três guarda-chuvas a um cantinho, junto com a comida e o leite que lhe trazemos.

Não longe dali, há outro homem que vive na rua e pede que as próximas equipas da Comunidade Vida e Paz lhe tragam uma bomba e Ventilã, para a asma.

Diz que, com as mudanças de temperatura e a Primavera, quando tem crises é horrível, é como se estivesse a afogar-se e fosse morrer.

Acrescenta que a comida oferecida por algumas instituições de solidariedade nem sempre chega regularmente, o que constitui outra dificuldade.

Quando está muito calor, o apetite diminui. Mas há outra questão. Os alimentos que lhe trazem são sempre basicamente iguais. Acaba por comer sempre a mesma coisa.

Ter refeições iguais, sempre, todos os dias, é complicado…

O nosso amigo G, e N, a sua cadelinha meiga e amorosa, estão à nossa espera. O rapaz aceita a comida e pede que a Comunidade Vida e Paz tente trazer-lhe uns ténis 44, um número difícil de obter, mas ele só consegue usá-los se forem assim.

Diz-nos que hoje não precisa de ração para a sua amiguinha, e prometemos trazê-la na próxima volta. Explica que o ser simpático de pêlos brancos e escuros está com o período – Anda meio doida por causa disso. Tem que lhe pôr uma trela para ela não fazer disparates.

Desde que descobrimos a sua mascote e tentamos apoiá-los aos dois em conjunto, com a ajuda da associação Animalife, tem sempre um sorriso amável, divertido e descontraído para nós.

Ama a sua irresistível companhia. Brinca com ela e puxa-lhe suavemente pela cabecinha: “Sua tola, sua tola! É uma tola”, repete, amorosamente.

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