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“Mas… Mas… Não quer um telefone?!”

Do outro lado da linha ouço a voz, profissional e com poucas inflexões. “Boa tarde. Fala a Maria Joaquina, da Meo. Senhor Vasco Ventura, tem possibilidade de falar um pouco connosco agora?”.

“Bem, estou um pouco apressado, mas prefiro responder já do que deixar para depois. É rápido?”.

“Tentaremos ser breves”.

“Muito bem. Diga, então”.

“O senhor Vasco estaria interessado em comprar um novo smartphone, um equipamento com câmara, internet, écrã de alta resolução, de elevada qualidade, da marca x, podendo adquiri-lo a preço mais baixo, graças aos seus pontos acumulados na Meo?”.

“Não”.

“Não?”.

“Não”.

“Não?!”.

“Não”.

“Porquê, senhor Vasco?”.

“Porquê… Ora, não quero, pronto”.

“Mas… Porquê…?!?!?! O equipamento que está a usar acabou de ser comprado agora? Existe alguma outra razão?”.

“Não, não existe nenhuma razão… Tem que existir uma razão? Não quero, ponto final”.

“Ah… Está bem… Senhor Vasco, vamos alterar o seu tarifário. Continuará a pagar dez euros, terá chamadas e mensagens ilimitadas para todas as redes fixas e móveis e vamos duplicar o seu número de dados. Interessa-lhe?”.

“Sim, sim”.

“Muito bem. A alteração será efectuada dentro de 24 horas. Tem mesmo a certeza de que não quer um equipamento novo?”.

“Sim, sim”.

No nosso mundo e na nossa sociedade parece algo bizarro, de outro planeta, que alguém não queira comprar um smartphone novo, um I-Phone 7, um Samsung, um Huawei, um tablet da melhor marca, um portátil de elevada capacidade, de última geração, um écrã gigante doméstico (para fazer o quê?!), um sistema de som surround e ter isso tudo ligado em rede, a funcionar em sintonia ao mesmo tempo.

Uma das coisas boas que a condição de desempregado nos dá é que nos estamos mesmo completamente nas tintas para toda essa tralha vazia, inútil e desprovida de qualquer significado para a vida espiritual da humanidade.

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