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Os príncipes que sobreviveram a tudo

Cheguei lá a casa, a um lugar que pouco conhecia e onde não era familiar. Mas a Matilde, para quem eu também era um estranho, veio pôr-se ao meu colo e ali ficou. Alguém me disse: “Deves ser muito boa pessoa, ela não faz isso a ninguém”.

Comecei a ir mais frequentemente a essa mesma casa, e também a dormir lá. Logo desde as primeiras vezes em que apareci, o Jeremias vinha sempre ter comigo, cheirar-me, conhecer-me, agradado com a presença de mais um humano divertido e descontraído por ali.

Quando passava lá a noite e ia correr na manhã seguinte, especialmente se chovia e se eu transpirava muito, ele deliciava-se totalmente a cheirar as minhas roupas depois do treino, a esfregar-se e a enrolar-se nelas durante uma meia hora. Adorava mesmo aquilo.

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Mais tarde, durante os anos em que vivemos todos juntos, o Jeremias e a Matilde tiveram que aceitar, à força, o Chiquinho – que, onde quer que chegue, assume sempre que tudo e todos lhe pertencem, e a mais ninguém.

Para a Matilde, mais tímida, reservada e assustadiça, foi difícil. Tão difícil que, durante muito tempo, ela alargava esse medo que lhe tinha: Estendia o receio à minha pessoa, o dono do Chiquinho, e não me deixava aproximar muito.

Quando nos divorciámos e a dona de sempre do Jeremias e da Matilde teve que emigrar, não foi fácil. Os dois príncipezinhos cinzentos sofreram. O Jeremias andou adoentado, a Matildinha ainda mais isolada e quieta do que de costume.

Quando esta rapariga gentil que fez parte da minha vida e será sempre minha amiga vem a Portugal, há uma paragem prévia antes de ver a mãe e os amigos. Vem ansiosamente a Santa Apolónia encontrar o Jeremias, a Matilde, o Chiquinho e a Amélinha, a “Gáata!”. Que reagem, todos, como se tivessem passado, não anos, mas segundos. Algo que também mostra muito bem os gatos que estes gatos são.

Os anos foram passando e os meus pequenos monarcas adaptaram-se a tudo. Consideram-se profundamente meus, ou teorizam que eu lhes pertenço total e absolutamente.

O Jeremias adora vir para cima das minhas pernas, da minha barriga, do meu peito, das minhas costas, na cama ou no sofá. Esteja eu vestido e confortavelmente acobertado, ou nu e integralmente desprotegido. Gosta convictamente de estar em contacto directo com a minha pele. Aí está uma das coisas que ele faz e mais nenhum gato faz.

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A Matilde, ganhei o coração dela sem a mais pequena reserva, quando ela fez a operação e eu a acompanhei e protegi diariamente, todos os dias, mimando-a, reconfortando-a, ouvindo as queixas e os suaves e doces protestos dela. Agora esforça a vozinha fina para me chamar a atenção quando me vê, quando acordo, quando passo por ela, quando vou visitá-la ao seu domínio seguro, a cozinha.

Amanhã é o Dia do Animal, e o Jeremias e a Matilde fazem 10 anos. Sempre vos digo que esta coisa de a esperança de vida dos animais de estimação ser umas quatro vezes inferior à dos humanos é uma grande estupidez. Onde é que já se viu, que sentido faz isso? Se eles são os nossos companheiros, e nós somos os amigos deles, então…?!

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  1. Tudo dito. Também acho uma grande maldade eles terem tão pouco tempo em relação a nós. >.< Não concordo e nem quero admitir que seja verdade. A verdade que eu quero admitir é que eles estejam cá o tempo que eu estiver <3 ?