Envio esta carta para ti, pessoa que não existe. Já ninguém as escreve, hoje em dia.
Se alguém redigisse uma epístola, ela poderia soar mais ou menos assim.
Querida pessoa, espero que te encontres bem. Há muito tempo que não nos vemos, não faço ideia de como te sentes.
Queria falar-te de como transcorrem hoje os meus dias. Como deverás saber, há 32 anos apostei numa profissão que, décadas depois, entraria em vias de extinção.
É nesse caminho que se encontra agora, e depois de um ano e meio a tentar regressar a ela percebi que estava a tentar furar uma parede de ferro com a palma da minha mão.
Alterei a estratégia e fui trabalhar para um sector completamente diferente.
Agora falo com brasileiros e portugueses todos os dias, tendo por função resolver os problemas que podem surgir durante uma viagem.
É uma forma de ganhar a vida como qualquer outra. Trabalho oito horas por dia, em horários rotativos, cinco dias por semana, com folgas alternadas.
A paixão maior fica para outras áreas da minha vida.
Mas agora gostava de saber de ti.
Como vai a tua existência neste momento? O casamento corre-te bem? Os teus filhos estão crescidos e felizes?
Como foram as férias? Onde vais passar o último dia do ano? Já compraste as prendas de Natal?
Conta-me, diz-me, relata-me tudo. Quero ouvir-te, desejo saber os teus anseios e o que te faz feliz, querida pessoa que não existe.