– Então, como é que foi o seu jantar, a 50 quilómetros, em noite de temporal brutal?
– Olha, então foi as azeitonas, o pão e a salada. E o bacalhau. Paguei 15 euros. Mais a gasolina.
– E o tempo?
– Bom, só começou a chover já durante o jantar. Devagarinho, devagarinho, mas nunca mais parou.
– Então e o jogo?
–Épá, fomos roubados. Perder assim é muita mau, pá!
No café dos Gatos Pretos as conversas prosseguem, no fim-de-semana do vendaval, dos alertas laranja e da derrota de Portugal.
Indiferentes a tudo isso estão os felinos negros. Este é o lugar das pequenas panteras da cor da noite.
Os donos do estabelecimento alimentam-nos, mimam-nos, esterilizam-nos, tomam conta deles. São entre dez e quinze seres misteriosos e ronronantes, quase todos de pelagem parecida com o breu.
Há umas, um pouco mais jovens, que residem ali à porta, nas arcadas, protegidas pelas grades – num espaço amplo e seguro onde têm as suas camas e casas de banho. Uma espécie de galeria e refúgio.
É boa gente, aquela que está à frente do estabelecimento, e, claro, adoram animais.
Já andam por cá há muito tempo. A senhora tem as instalações cheias de decorações natalícias elaboradas por ela, a partir de materiais como rolhas, tampas, plásticos e por aí fora.
Gosto do lugar, acho-o positivo e inspirador, com a sua coluna a rodar a rádio M80 sem exagerar – muito – no volume, e as reuniões espontâneas de vizinhos, um micro-cosmos civilizacional. Inclui uma ou outra criança, alguns jovens adultos, uma boa percentagem de pessoas de meia idade e uma maioria de idosos.
Acabo por ouvir a vida, os dramas e os problemas dos outros, desde a senhora que tem o marido acamado ao homem de 60 anos cujo neto sofre de cancro e pratica desportos aquáticos.
Sempre que há um raio de Sol fico lá fora, para lá do toldo, mesmo que a esplanada não esteja montada, a observar os gatos. No café das panteras negras.