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44 anos, desempregada

Foi a pessoa por quem mais senti amizade e fraternidade no Instituto de Ciências Sociais e Políticas, o feudo dos fachos, uma faculdade onde muito poucos não eram betos, arrogantes e pretensiosos.

C esteve, depois, comigo na RTP, e também no jornal Fórum Estudante, de que fui editor durante três anos, por sua intervenção indirecta: Foi quem me levou para lá inicialmente.

Costumamos conversar com alguns meses ou anos de intervalo, pelo telefone, por mensagens, no Facebook ou quando nos encontramos por acidente na rua. Agora tem duas filhas, uma já está a estudar no Algarve, outra é mais novita.

C tem menos um ano que eu. Há umas semanas, ligou-me a pedir conselhos e ideias. Aos 44 anos, despediu-se. A cara-metade ganha pouco e tem um trabalho precário, e, pois é, têm duas filhas.

C estava naquela empresa havia mais tempo que eu na minha, quando fui alvo de reestruturação e enviado para as filas do Instituto do Emprego. Ficou por lá mais de 14 anos, foi quase o único trabalho estável e formal que teve na vida.

Agora já chegava. Não só o trabalho era pouco interessante e estimulante, mas também o ambiente se tornara execrável e insuportável. Andava toda a gente a discutir, aos gritos, o tempo todo, naquela pequena organização.

C já não aguentava e veio-se embora. Sem indemnização. Com direito a um magro subsídio de desemprego, pouco acima do salário mínimo, já que ganhava mal que se fartava. Diz-me que, no seu casal mal pago e com duas filhas estudantes, conseguiu poupar para seis meses.

Haverá quem pense que não tem juízo, ao colocar-se nesta situação nesta altura da vida. Não teria coragem para fazer o mesmo. Mas, após ouvir C, os seus anseios, os seus medos e as suas convicções durante uma hora, percebi, ou lembrei-me: Uma coisa é mais que certa.

Quando a hora chega, ela chega. Quando está na altura de virar costas, deixar para trás, correr todos os riscos e abandonar tudo aquilo que nos está a fazer mal, não podemos deixar de ouvir essa canção.

É a voz do futuro, o som do destino. E quando sabemos que esse rumor é mais forte e mais acertado do que qualquer outro eco dentro de nós, só há uma coisa a fazer.

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