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Desempregado: A minha primeira convocatória ao centro de emprego

Um jovem do Espaço Jovem dos Olivais atende e pede a carta de convocatória do Instituto do Emprego, prometendo devolvê-la no final, assinada e carimbada, e, antes disso, chamar toda a gente pelo nome.

Cinco senhoras ciganas e dois homens da mesma etnia fazem parte do grupo de trinta desempregados chamados a comparecer. As mulheres de trança e saia comprida, conversadoras e animadas, e os dois homens, falam convictamente das mortes e doenças da família e do clã, e das múltiplas ligações que existem entre eles, mesmo que nunca se tenham encontrado ao vivo.

As três dezenas de homens, rapazes, senhoras e raparigas de diversa extracção social acabam por ser recolhidas dentro de um pequeno espaço de recepção e conduzidas ordeiramente para uma sala nas catacumbas do Espaço Jovem dos Olivais.

A técnica do IEFP dá as boas vindas. Preenchem-se fichas de inscrição que, diz, são só para ela “e não para o IEFP”. Empresto uma caneta à esquerda, outra à direita e preencho o meu papelinho de cinco centímetros quadrados com o nome, idade, profissão e habilitações.

O rapazinho indiano à minha esquerda nada fala de português e pouco de inglês. Ajudo-o a preencher a ficha, libertando a técnica e formadora, que também tem que ajudar uma senhora, que não sabe escrever, lá ao fundo.

Começa a formação. O objectivo é dar a conhecer as várias ferramentas de apoio ao emprego do Estado socialista que é pago pelos nossos elevados impostos e nos proporciona a segurança social.

A formadora vai apresentando, criticando, traduzindo e interpretando as várias medidas estatais de ajuda à procura de trabalho.

À esquerda, escondido por uma fila de cadeiras, há um homem de trinta e tal anos que coloca perguntas, e mais dúvidas, e novas incertezas.

Ataca e questiona o funcionamento do Estado, produzindo infinitos desabafos sobre a burocracia e a ineficácia do sistema. Ao fim de 15 minutos disto, toda a gente se vai mexendo nas cadeiras e fixando o olhar no infinito, para lá das paredes da sala.

Às tantas, passo-me. “Desculpe lá, temos que estar aqui a discutir o sexo dos anjos?! Não podemos acelerar?!”. Ouve-se um rumor mal controlado de concordância e aprovação geral. “Sim, sim, claro, tem razão”.

O homem cala-se, por fim. O moço indiano à minha esquerda, impaciente e irritado, revira os olhos e encolhe os ombros. Segue-se meia hora um pouco mais fluída e a sessão termina.

Os sete ciganos conversadores e sociáveis pedem para assinar a folha de presença primeiro porque estão com pressa. O resto do grupo aguarda, divertido e paciente, enquanto o pequeno clã assina, junto ao quadro dos slides, volta a trocar comovidos e efusivos abraços e envia cumprimentos e saudações sentidas para todos os familiares e amigos.

O rapazinho indiano comenta, em inglês: “It’s a drama!!” (algo como, julgo entender no seu sentir: “É uma peça de teatro!!”). Rimos os dois e respondo, na língua de Shakespeare: “E ainda por cima é de graça!!”.

Quando finalmente nos é permitido assinar a folha, a mulher à minha direita já está demasiado impaciente e exige que lha passe. “Uma fracção de segundo enquanto procuro o meu nome”, respondo. Mais uma fracção de segundo não faz diferença.

A formadora agradece-nos e pede-nos desculpa, e eu a ela, pelo meu passanço de há pouco. “Ah, não se preocupe, é normal! Nós já estamos preparados para tudo!”.

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