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Uma luz de esperança

Veste roupas de apresentação impecável e mostra um brilho de esperança nos olhos. O jovem africano aceita dois sacos de comida e deixa ver os dentes brancos, simpático e alegre.

Mostra o bloco com os desenhos que está a preparar. Bonitas figuras de cavalos, pessoas, presépios e tudo o que lhe dita a imaginação.

Está contente porque várias pessoas elogiam a sua arte inspiradora e há entidades que estão a encomendar-lhe trabalho. As páginas onde aparecem cavalos bem delineados destinam-se à preparação de pinturas que vão figurar num hipódromo.

Sorri e comenta que muitas pessoas vão para a faculdade estudar arte. Mas a ele, segundo alguns dos apreciadores dos seus traços, as formas surgem naturalmente sem ter recebido essa formação.

Enquanto revela uma folha onde experimenta misturas de cores, agradece muito os alimentos fornecidos pela Comunidade Vida e Paz.

Ao encontro da carrinha surge um homem na casa dos 30, muito nervoso. É epiléptico. Tinha vindo a Lisboa com a intenção de ficar um ou dois dias, mas surgiram imprevistos.

Há 24 horas que se lhe acabou a medicação e está preocupado. Diz que com cada crise que sofre a cabeça fica mais afectada. É cada vez pior, desde que teve um violento acidente que o deixou com esta doença. O facto de ter sido toxicodependente não ajuda.

A equipa leva-o ao hospital para que possa ser convenientemente medicado e acompanhado.

A meio da noite o profeta da calçada, cego e octogenário, prepara-se para descansar. Dispõe pequenas e finas mantas em cima de uma esponja de pouco mais de um metro de comprimento, e um delgado cobertor por cima. À cabeceira uma almofada gasta pelo tempo.

A segurar tudo no chão de pedra, prendendo a improvisada cama contra um degrau de escada, garrafas de água e de sumo e um saco para fazer peso.

Sobre a Humanidade comenta que todos nós, ao contrário dele, somos escravos. Fazemos o que nos mandam. Obedecemos e não temos opção.

Isso não lhe interessa. Vive em absoluta liberdade, e aos 85 anos sente que não ficará muito mais tempo por cá.

Não é o caso de um conversador quarentão, que nos conta tudo sobre a sua condição diabética. Recorda que sempre teve uma higiene oral irrepreensível.

Apesar disso acabou por perder quase todos os dentes. Por culpa da diabetes, diz. Critica quem não cuida bem da boca, já que as outras pessoas não têm que aguentar o nosso mau hálito quando falamos com elas.

Informa-nos de que falou com a equipa do programa televisivo do apresentador Manuel Luís Goucha sobre os seus problemas de saúde e a impossibilidade de resolvê-los.

Afirma que a estação de TV vai oferecer-lhe um tratamento dentário.

O momento mais inspirador da noite ainda está por acontecer. No centro da cidade, pessoas carenciadas juntam-se à volta da carrinha da Comunidade Vida e Paz.

Chega de mota um rapaz da empresa de entrega de comida Uber Eats. Desmonta do motociclo e entrega uma caixa com uma refeição a um dos homens que recebem os sacos da instituição de solidariedade.

Um minuto depois os voluntários metem-se à conversa com o jovem. A comida tinha sido encomendada para uma morada incorrecta e substituída por outro pedido, para o endereço certo.

Aquela refeição ia perder-se… Foi entregá-la a alguém que precisava dela.

Quer saber tudo sobre o nosso trabalho. Diz que mesmo que sejamos agnósticos ou ateus, somos os verdadeiros cristãos, aquele que seguem os ensinamento de Cristo. Apoiar, amparar, compreender. Dar algo a quem não tem nada.

Ficamos então a saber: Ainda que possamos estar desprovidos de fé religiosa, estamos aqui a fazer o trabalho de Cristo…

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