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As três torradeiras

Além de me encherem de comida (vegan), de bebida (vinho, e um whisky exclusivamente destinado a mim, no fim), salada, fruta, frutos secos, boas conversas sobre o que aconteceu no Mundo, na Cidade e na Província nos últimos setenta anos, os meus pais, ao Domingo, vão, depois, dar uma volta comigo, que inclui sempre um pouco de rio ou Mar.

Se o meu pai está um pouco mais à pressa nesse dia e vai ver o Benfica, ou os Júniores, ou a Selecção, o resto da tarde é para conversas de mãe e filho. Onde se pode falar de tudo, mesmo tudo, sem quaisquer restrições.

Os diálogos acontecem num passeio marítimo ou fluvial acrescentado, numa sala de cinema… Ou em casa, em frente à super-televisão dos meus pais, que, agora, já têm finalmente a boxe e os seus 300 mil canais, dos quais qualquer pessoa nunca vê mais de quatro ou cinco.

A minha mãe deixa-me escolher o canal, o programa (isto é, o filme) e o volume do som. Até me aconselha, dizendo-me quais são as películas mais interessantes que andam a marinar pelos cabos televisivos. Quando vou para casa, acabo por procurar na minha boxe a história que ela me ajudou a escolher, metê-la para trás e vê-la do princípio ao fim.

Ao terminarmos as nossas sessões de conversação dominicais que me curam discreta e imperceptivelmente (não para ela, que detecta sempre tudo), passamos de novo à cozinha.

Para um vegan e uma mãe que o é espiritualmente, esperam-nos várias variedades de pão deliciosas e substanciais, manteiga estritamente vegetal, diversos doces e um bom chá de diferentes sabores à escolha, com ou sem adição de limão. É coisa para durar pelo menos meia hora.

Pão torrado e família Ventura são duas expressões que coexistem constantemente nas mesmas frases. Há sempre uma torradeira pronta a torrar por onde andamos. Como são muito usadas, e ninguém tem orçamento para uma torradeira que dure para sempre, volta e meia avariam.

Num destes dias, a torradeira não segurava o pão. Lá teve a minha mãe que ficar a carregar para baixo, para que o dispositivo conseguisse fazer o seu trabalho aceitavelmente.

Foram à loja e deram-lhes outra. Não funcionava. Voltaram lá e entregaram-lhes outra vez uma nova. Também não trabalhava.

O meu pai encheu-se de moscas. Pediu o valor da torradeira, juntou mais alguns euros e comprou uma, brilhante e imponente, que não tem ar de quem vá recusar-se a trabalhar conveniente e correctamente nos próximos séculos.

Este Domingo à tarde não faltaram torradas bem nutridas e abundantemente barradas para o nosso lanchinho. E ninguém teve que ficar a empurrar o pão para baixo.

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