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Engoliu uma caneleira

Todos os dias, o gato engolia uma fita de plástico, das que os sacos de lixo trazem para ser atados. Uma obsessão de que muitos felinos sofrem, e até teria piada, não fossem os riscos graves que isso pode trazer.

Mas como era rápido e sorrateiro, a dona não conseguia impedi-lo. A Doutora perguntava-lhe sempre se o animal estava bem, se tinha fezes estranhas, se vomitava. Tudo normal.

Um dia, pela primeira vez em toda a sua vida, vomitou. Notou-se, também, que estava mais magro. Durante um período longo e preocupante, este bicho empreendedor e determinado ingerira as sinistras e discretas fitas, sem as regurgitar e sem produzir dejectos invulgares…

Quando foi examinado, solucionou-se o mistério. Tinha uma grande bola de plástico dentro do estômago, e era por isso que estava a ficar delgado: Já não conseguia alimentar-se convenientemente.

Felizmente a história acabou bem, com os dotes cirúrgicos da Doutora a tratarem de extrair com eficácia a bola de plástico do interior daquele ser indefeso e endiabrado.

O caso clínico surgiu a propósito de uma história impressionante. Nesse dia, tinha acabado de dar entrada nas instalações clínicas um Retriever, um amigo canino pachorrento, carinhoso e com doses apreciáveis de loucura animal, apesar dos seus respeitáveis 15 anos de idade.

Tinha comido… Uma caneleira. Pois, um objecto de borracha do tamanho da mão de um humano adulto. O que fazer?

Visto que também este utente não defecou o estranho objecto que consumiu, que foi detectado bem inteiro dentro dele através de exames, tiveram que lhe abrir o estômago. Uma operação não especialmente perigosa, mas que seria preferível (embora impossível) evitar, neste cão já em fase geriátrica. Teve que ser.

Perante estes relatos, vêm à memória momentos vividos pela minha “Gááta”, que reúne a doidice imprevisível destes dois seres peludos e ainda a multiplica por dez ou vinte.

Num desses momentos de delírio, e numa época em que ainda não era tão evidente que, com ela, é preciso ter sempre três olhos, teve também o seu episódio plástico. O principal, não o único.

Na fracção de segundo em que o saco de lixo foi desenrolado e preparado para o seu uso natural, e sem que fosse possível impedi-lo, devorou a respectiva fita.

Seguiu-se um telefonema imediato para uma grande amiga e especialista em disparates felinos. Recomendou muita atenção nas horas e dias seguintes, a vómitos, dejectos, sintomas e comportamentos invulgares.

Nada aconteceu, e depois disso já foi vista pela Doutora milhares de vezes. Mas tornou-se evidente que ela e objectos de plástico (ou de metal, ou comprimidos de qualquer tipo) não podem coexistir no mesmo espaço…

A maioria dos gatos têm que ser obrigados a engolir os fármacos de que precisam. No caso da “Gááta”, os que ela tem que tomar são postos na palma da mão: Agarra-os, mastiga-os e come-os sofregamente.

E se a deixarem, faz o mesmo aos dos outros gatos, ou a algum que o dono esteja a tomar. Com felinos assim, todos os cuidados são poucos. O que para nós é inofensivo, para eles pode ter efeitos tóxicos ou mortais.

Cá em casa, plásticos, metais e comprimidos passaram a ser encerrados e vigiados 24 horas por dia.

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