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Os camones não andam de táxi

Hey! Hey! Oh! Oh! Ah! Ah! Hey!”. Do outro lado da rua, meia dúzia de jovens saudáveis e bem constituídos vai soltando pequenos gritos de incentivo, enquanto, em roda fechada no pequeno pátio do prédio, vão atirando uns aos outros e apanhando no ar várias bolas de râguebi, tantas como eles.

Agarram com a mão, chutam com o pé, saltam no ar, esticam-se para alcançá-las. O ruído distrai, momentaneamente, quem está alguns andares cima, levando a satisfazer a curiosidade e espreitar pela janela para ver o que se passa ali embaixo. São estrangeiros, não se percebe bem de onde.

Estou a viver em Lisboa há cinco anos, e a cidade encontra-se totalmente repleta de “camones”, tuk-tuks, carrinhos eléctricos, trotinetes, passageiros de cruzeiros, excursões, guias e visitas guiadas. Isso não me chateia nada. Sou a favor do turismo, das poucas actividades económicas que sobrevivem em Portugal. Defendo o turismo de massas e o turismo das elites, em coexistência harmoniosa e benéfica no mesmo país.

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Não acho que só deva existir turismo de pé descalço, como o que eu fazia quando fazia algum, nem apenas turismo de elites. Há lugar para tudo e tudo faz sentido. E o país não deve ser só para turistas. Em menos de dois anos, foi anunciada a construção de mais de 200 hotéis em Lisboa. No mesmo espaço de tempo, quantas habitações sociais e prédios de rendas com custos controlados foram construídos em Portugal?

Também tenho visto as filas de turistas a engrossar no metro. O metro de Lisboa está o raio do caos e a pura da confusão. E pergunta-se: Quem é que despediu 45 funcionários do metro, enquanto a sua rede passava dos 12 quilómetros para os 40, as carruagens atingiam os 25 anos e a máquina responsável pelas reparações os 41? Os extraterrestres? Este Governo, que ainda só lá esteve o tempo suficiente para aprovar um Orçamento do Estado? Não, não foram os marcianos nem este Governo que come criancinhas. Foi o Governo anterior.

Também reparo que os simpáticos e alegres camones andam de tuk tuk… E de Uber. Ora bem, se há serviços de transporte automóvel que cobram para transportar uma pessoa de um ponto para outro, como fazem os táxis, esses serviços devem estar sujeitos a regras e impostos, como os táxis.

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Mas, entre todas as pessoas que já andaram de táxi na vida, quem é que ainda não teve uma má experiência? Ou várias? Poder-se-ia dizer o mesmo em relação aos serviços da Uber?

Pense-se noutra coisa. Como é que uma parte dos taxistas e dos seus representantes defendem os direitos que conquistaram e adquiriram legalmente ao longo dos anos? Com insultos, ataques, agressões, ameaças de violência e de morte.

O sector do táxi, como outros, é uma corporação, um lobby, um grupo de interesse. Construiu, conquistou e assegurou os seus direitos e o seu estatuto ao longo dos anos. Luta por eles e não quer perdê-los. E a forma como luta, e, por vezes, como trata os clientes, mostra uma coisa. Consideram-se acima da lei e do controlo democrático. Acreditam que são uma aristocracia à parte e que ninguém pode tocar-lhes.

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  1. Muito bem dito! Podem e devem exigir regras idênticas às plataformas, mas eles são os maiores responsáveis dá má fama que têm…