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A língua que os gatos falam

Não consigo parar de ver” é a legenda de um vídeo em que dois gatos amorosos falam, conversam, comunicam, dialogam e debatem durante vários minutos, como se fossem humanos a discorrer sobre o jogo de futebol da jornada do fim-de-semana.

Ainda não apanhei os meus gatos a recorrer ao discurso felino com tanta fluência e naturalidade entre eles. Normalmente, trocam as suas impressões entre si de uma forma mais directa e menos complicada.

Um simples “uen”, uma cheiradela um ao outro, um “mnheeu”, umas lambidelas (muitas vezes nas nádegas uns dos outros, sem grandes distinções mas com alguma fixação colectiva no traseiro da Amélinha, a “Gááta!”), chegam-lhes para transmitir o que têm a dizer uns aos outros.

Mas quando se trata da comunicação deles comigo, já é muito diferente. O Jeremias entoa eternamente as suas Jeremíadas. O meu lindo lince gato-cão está sempre a lamentar-se de alguma coisa, de noite e de dia. Quer mais mimos, mais atenção, mais da minha presença directamente junto dele (com ele generalizadamente espalhado por cima do meu corpo), mais comida, mais guloseimas. “Ueeen, ueen, ueen, uoon, ueen, uoon”.

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A Matilde, ao acordar, dá-me o seu “mnheeu” carinhoso de bons dias. Se no caso das fêmeas humanas será uma ofensa dizer que o seu lugar é na cozinha, quando falamos da Matilde é apenas uma realidade. E quando vou ter com ela aos seus domínios femininos, entre tachos, panelas e fogões, oiço os mesmos “mnheeu” igualmente carinhosos, enquanto anda atrás de mim e se roça nas minhas pernas. É também esse som que pronuncia, até ficar sem voz, quando lhe preparo a medicação… Com o belo do patê, uma bem-vinda variação em relação à ração sempre igual.

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No caso da Amélinha, a “Gáta!”, a sua ligação é a de alguém que, aos dois meses, decidiu ser especificamente minha. Sempre que passo por ela tenho direito aos dedicados “mnhau”, “mnhau-mnhau”, “mnhau-mnhau-mnhau”, os “uhm”, “ihm”, que se tornam bem mais intensos se lhe tocar, mesmo só com a ponta do dedo. Se lhe pego ao colo (acontece uma 30 vezes por dia), oiço o contínuo e ininterrupto “rrrrrrrrrr” de prazer, protecção e satisfação.

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O Chiquinho, o meu Chiquinho, é um pequeno ser dotado de profunda inteligência e sensibilidade. Tem uma conexão intensa e única com o humano que o trouxe da rua e lhe deu uma casa, amor, carinho, conforto e todos os cuidados médicos necessários.

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A língua que o Chiquinho fala é particularmente elaborada e humanizada. Se ele acha que tem menos um segundo de atenção do que a necessária para os seus elevados e exigentes padrões, se pensa que já devia estar a comer de novo e não está, se considera que lhe estou a dever umas dezenas de festinhas e miminhos de que está à espera há uns minutos…

Segue-se uma conversa felino-humana, repleta de amor, queixumes e admoestações, dele para mim. “Miaaaau”! Mia-a-a-a-a-a-a-a-a-a-a-a-u!!!!!!”! “Miaaaaaau”! Isto durante umas dezenas de segundos. Faço-lhe umas boas festinhas, massajo-lhe a barriguinha, pego nele ao colo (com os anos foi começando a permitir isso, e até a deixar-se ficar por um bom bocadinho)…

Vou respondendo em tom suave e reconfortante. “Sim, Chiquinho, sim, sim. Pronto, já passou, já passou, meu amor. Pronto, pronto!”.

Esta é a língua que os gatos falam.

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