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Ouvia o vento e interpretava o luar

A mulher doce e gentil chega à praça das cerejeiras e aspira o ar com enorme prazer. Dirige-se à pastelaria-roulote e diz ao patrão do pequeno estabelecimento que gostaria imenso de trabalhar ali. O homem, delicado e respeitoso, não a leva a sério, devido ao aspecto frágil e idoso da senhora, que diz aceitar com enorme agrado um terço do salário que ele pagaria normalmente.

Nas suas idas e vindas, insistindo na sua disponibilidade, deixa-lhe a pasta de feijão feita por ela em casa, como possibilidade de substituição da que o homem usa habitualmente para rechear os seus bolinhos. Ele deita-a fora, mas depois acaba por abrir a embalagem, por curiosidade. A substância é tão deliciosa que ele contrata a anciã sensível.

No dia seguinte, e por sugestão dela, a pastelaria abre muito antes do nascer do sol. A preparação da pasta de feijão, que se faz no próprio dia e seria ofensivo e indigno encomendar a qualquer entidade externa, demora muitas horas.

É preciso lavar, cheirar, escolher, ouvir, sentir a qualidade e as características do feijão, passá-lo por várias cozeduras, deixar que os ingredientes se habituem e adaptem uns aos outros. A partir desse dia, a pastelaria, que contava com meia dúzia de clientes, passa a ter sempre filas à porta desde manhã cedo.

A velhinha sábia e talentosa é alguém que ouve os ventos, interpreta o que dizem os pôres-do-sol e as noites de luar, as mensagens que circulam pelos ares do Mundo. Sentiu que o espírito e o coração daquele homem precisavam de ajuda, orientação e amor. Foi por isso que veio. E foi tudo isso que lhe trouxe.

Uma Pastelaria em Tóquio, realizado por Naomi Kawase em 2015 e estreado em Portugal em 2016, é um poema em forma de filme. Uma história de generosidade, simplicidade e carinho. Um relato que faz falta, em dias em que se ouve falar de tanta coisa no Mundo que não faz sentido…

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